Mapa da Ilha de Santa Catarina, de 1786. Acervo do Arquivo Histórico Militar de Lisboa
Há exatamente 239 anos. No ano de 1777 uma esquadra espanhola de 101 navios ancorava na praia de Canasvieiras com um único objetivo: tomar posse da Ilha de Santa Catarina!
Mas o que levou a coroa espanhola a desejar a Ilha e porque não estamos hoje em um território espanhol, falando a língua dos nossos "hermanos"?
Tudo começou muitos anos antes de 1777...
A partir do inicio do século XVI, a Ilha de Santa Catarina foi se tornando muito importante, pois suas duas baias eram locais seguros para ancoragem de embarcações, as florestas do entorno ofereciam madeira para conserto dos navios e os índios que na Ilha viviam eram amistosos, facilitando o acesso dos europeus a água e comida, além destas baias serem o último porto seguro ao sul da América do Sul até chegar à entrada do Rio da Prata. Com todos estes benefícios a Ilha se tornou um ponto de parada obrigatório para as embarcações de muitas coroas europeias que tinham como destino o Rio da Prata ou estreito de Magalhães, buscando acesso ao oceano pacifico.
A Ilha de Santa Catarina, era território da coroa portuguesa conforme o Tratado de Tordesilhas que foi criado lá em 1494. Este tratado afirmava que as terras a 370 léguas a leste de Cabo Verde (arquipélago localizado no Oceano Atlântico próximo da Africa) pertenciam a Portugal. E as terras a oeste desta linha pertenciam a Espanha. Lembrando que em 1494 o Brasil ainda não havia sido encontrado pelos europeus, e não se sabia ainda onde se passava esta linha, hoje sabemos que ela ia de Belém no Pará à cidade de Laguna em Santa Catarina:
Portanto, como se pode notar pelo enorme tamanho do Brasil, Portugal não respeitou o tratado e tomou posse de uma boa parte do que era da Espanha por direito, sendo que Portugal ocupou as terras até a foz do Rio da Prata onde hoje temos o Uruguai.
Os espanhóis não se defenderam, perdendo estas terras, e com o fato de mais outros inúmeros tratados não terem sido respeitados, decidem declarar guerra contra Portugal, invadir e tomar posse da Ilha de Santa Catarina, que a tempos já era muito desejada por eles, pela sua posição estratégica e por servir de um porto natural.
Sob o comando de Don Pedro Antonio de Cevallos os espanhóis partem da Espanha em uma centena de navios com um único destino: a Ilha de Santa Catarina! Sendo essa a maior das esquadras que já havia cruzado o oceano atlântico!
A invasão:
A grandiosa esquadra chega na enseada de Canasvieiras, dia 20 de fevereiro de 1777, durante uma madrugada calma, fixam um posto de comando em um local onde chamam de Ilha dos Loros (atual Ilha do Francês). E lá elaboram uma estratégia de invasão. Dia 23 de fevereiro, decidem desembarcar na praia de São Francisco de Paula (como era chamada a praia de Canasvieiras antigamente).
Os espanhóis não encontraram nenhuma resistência por parte dos militares portugueses, que eram em um número muito inferior. Somente algumas centenas, frente aos 8.000 soldados espanhóis que desembarcaram. Vendo a quantidade de espanhóis, os portugueses literalmente fugiram para o mato! A população da Ilha naquela época era muito pequena, formada de cerca de 800 famílias de recentes imigrantes portugueses vindos das ilhas do Arquipélago dos Açores. A maioria dos habitantes fugiram para as montanhas, abandonando suas casas, plantações e pertences.
Sem nenhum empecilho o comandante Cevallos desembarcou na ilha, instalando-se na colina onde hoje temos a Igreja de São Francisco de Paula em Canasvieiras. Durante a madrugada do dia 24 decidem invadir o Forte de São José da Ponta Grossa, foram caminhando por todo o atual bairro do Jurerê que naquela época era composto por um manguezal e uma vegetação intensa e de difícil aceso. Ainda estabelecem um observatório no morro da Cachoeira, que possui uma vista de toda a entrada do norte da Ilha
Imagem com um mapa do norte da Ilha, e com os pontos onde os espanhóis se estabeleceram.
Após invadir o Forte de São José da Ponta Grossa e finalmente Cevallos toma posse definitiva da Ilha de Santa Catarina hasteando a bandeira da coroa espanhola em Ponta Grossa. Algumas horas depois Cevallos invade também a Fortaleza de Santa Cruz na Ilha de Anhatomirim. Com isso os espanhóis vão se espalhando pelos arredores da Ilha de Santa Catarina, ocupando as fortalezas e as casas dos habitantes fugidos.
Grande parte dos militares portugueses fugiram para outras vilas no continente e após menos de um mês da invasão os moradores foram voltando as suas casas, e voltando a sua rotina normal, só que agora sobre a proteção do Rei da Espanha. Os militares espanhóis vão se dividindo pela Ilha, trabalhando principalmente na pesca da baleia. Alguns até se casaram e tiveram filhos com moradoras locais. (Portanto quem é nativo da ilha, talvez possa ser um dos descendentes dos espanhóis atores da invasão).
Os militares portugueses sabiam da importância do local e fizeram algumas míseras tentativas de tomar de volta a ilha, todas sem sucesso.
Até que veio um tratado que pôs fim a tudo...
O Tratado de Ildefonso:
As negociações começaram quando D. Maria I, ascendeu ao trono português. E assim foi formulado um novo tratado em que pelas suas cláusulas Portugal recebia de volta a Ilha de Santa Catarina e ficava com quase todo o atual estado do Rio Grande do Sul. Enquanto a Espanha recebia em troca Colônia do Sacramento (uma cidade as margens do Rio da Prata, colonizada por portugueses e localizada no atual Uruguai).
Artigo I Do Tratado de San Ildefonso:
“Haverá uma paz perpétua e constante, assim por mar como terra, em qualquer parte do mundo, entre as duas nações portuguesa e espanhola”
No dia 31 de Julho de 1778 Espanha devolve a Ilha aos portugueses. Após uma guerra sem batalhas.
Se não fosse este tratado, Santa Catarina e o Rio Grande do Sul seriam hoje parte da América espanhola. O futuro desta parte da América do Sul seria totalmente diferente do atual.
Por ironia do destino Canasvieiras, o local do desembarque. Se tornou o destino predileto dos Argentinos, descendentes dos mesmos espanhóis que tanto desejaram a Ilha, comprovando o quanto estas terras são queridas pelos falantes de língua espanhola.
Praia de Canasvieiras atualmente, muitos dos seus turistas e moradores não tem ideia da importância histórica deste local.
*Obs: esta postagem, foi feita graças a leitura de fontes sérias e historiografias de consagrados historiadores da história catarinense, apenas retirei informações com o objetivo de divulgar esta história pouco contada de modo a conscientizar os leitores sobre a importância histórica da Ilha de Santa Catarina. Peço desculpas por qualquer equivoco, ou informação pouco esclarecedora. Espero ter ajudado, e me coloco a disposição para qualquer dúvida ou acréscimo.
Fontes e Referências Bibliográficas:
http://fortalezas.org/?ct=bibliografia&id_bibliografia=1861
https://pt.wikipedia.org/wiki/Tratado_de_Tordesilhas
MOSIMANN, J.C. Ilha de Santa Catarina: 1777-1778: a invasão espanhola. Florianópolis: Edição do autor, 2003.
PIAZZA, W.F. Santa Catarina: História da Gente. Florianópolis: Ed. Lunardelli, 2001, 5º ed. rev. e ampli.
CORREA, Carlos Humberto P. História de Florianópolis, ilustrada. Florianópolis: Ed. Insular, 2005, 3º ed.
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